domingo, junho 26, 2005

As novas gerações à espera de Godot

ROGÉRIO RODRIGUES

Cada vez mais a liberdade tem custos maiores. Num sistema democrático, a resistência dá lugar à rejeição. As novas gerações têm da liberdade um conhecimento restrito e, no entanto, como já nasceram nela, nem compreendem o que é viver sem ela. Mas estão estes jovens sujeitos ao recibo verde, à precariedade do emprego que não lhes dá, muitas das vezes, acesso a uma profissão, cuja licenciatura não tem validade nem reconhecimento social. São tribalmente solidários, mas socialmente fugitivos de qualquer causa maior. E, no entanto, serão porventura o espaço mais interessante deste País desinteressado. E tão rasteiro que acha a liberdade mais como um analgésico do que um estimulante. As novas gerações não suspeitam sequer da força que têm, em parte devido à ausência de líderes e à incapacidade reivindicativa. E, sendo gerações que sonham, escondem o sonho, ao mesmo tempo que, inconscientemente, afugentam a realidade. Ou se submetem ou não conseguem ser insubmissos. Terminam os cursos e vagueiam pelo País à procura de colocação numa escola, ou enviam currículos para jornais e empresas à procura de um estágio. São carne para canhão num quotidiano selvagem. Mesmo vampírico. São o sangue fresco que alimenta corpos que engordam e crescem à custa deles. E, no entanto, quanta luz brilha nos seus desejos e nas suas palavras. Não é uma geração perdida, apenas uma geração à procura. Mas à procura de quê, se para lá do espelho, há apenas outros espelhos, numa multiplicação de ilusões até à ilusão final? Os professores agora colocados, na maioria jovens e precários no mercado do trabalho educativo, vão andar pelo País, numa transumância que os impede de estabelecer elos sólidos com a comunidade. Não encontram os outros nem se encontram a eles. Esta itinerância em liberdade, desde que não discutam os critérios e os aceitem, gera a instabilidade a par do desinteresse. Não há nenhum acto forçado que provoque paixão. E no ensino, mais importante que o conhecimento, é a paixão de transmitir o que se conhece. Estas novas gerações, com jovens professores, jovens jornalistas, não são gerações perdidas ou queimadas, são apenas um amontoado de esperanças cortadas, um cardápio com páginas em branco em relação ao futuro. Alguns vão fugindo à monotonia da dúvida - ou porque têm nome de algo, socialmente transmissível, ou cunha, ou partido político. Os outros, a maioria, esperam que o vento comece a soprar pela manhã e abra portas cuja chave nunca lhes foi dada. À noite, no Bairro Alto, bebem mágoas, tal é o cansaço da procura. As novas gerações continuam à espera de Godot. O que não é novo.

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